Pesquisar este blog

sábado, 5 de março de 2011

Muito Obrigado à Unidos do Tabuleiro

Não poderia dizer que sou um itapemense nativo, pois sou de Gaspar, indo morar em Curitiba e passo somente alguns meses por ano em Itapema. Mas também não poderia dizer que sou um verdadeiro turista, pois afinal minha família já tem apartamento em Meia-Praia há quase 20 anos e assim já me sinto também meio morador local. Estou talvez naquele lugar de meio termo, um veranista clássico, mas que também aparece no inverno e em alguns fins de semana, não daria pra dizer que moro na praia, mas não posso negar que meu coração já está aqui. Em Itapema também me sinto em casa. E com esta breve explicação começo meu pequeno texto de agradecimento à iniciativa de Itapema para este carnaval: a Escola de Samba Unidos do Tabuleiro!
Há uns dois anos já venho reclamando das opções de interação social na cidade, reclamação que talvez caiba a muitas outras cidades de nossa região. Saio andando pela Avenida Nereu Ramos e encontro barzinhos, alguns bem simpáticos, com a TV ligada, alguns com novela, outro com futebol, um outro num canal por assinatura passando cenas de acidentes... E as pessoas sentadas nas mesinhas, tomando seu chopp e vendo TV. Pessoas saindo de casa para ver TV? Onde está a interação social? Sair de casa e ir a um barzinho, a um restaurante é muito importante para a saúde de uma sociedade, é um lugar de recriação social, uma possibilidade real de interação entre as pessoas, ali podemos praticar o convívio, trocar olhares, trocar modos, sairmos um pouco de nossas bolhas e sermos sociais, característica primordial de nossa espécie. Na interação em lugares públicos como um barzinho ou uma festa podem surgir novas amizades, novas paqueras e, por quê não, novos amores. Sinto que uma TV ligada nestes lugares atrapalha o virtuosismo desta interação. A TV não interage...
Muito parecida com esta lógica da anti-interação são os pequenos grupinhos que se formam em torno dos carros com som literalmente ensurdecedor. Um som com volume tão forte que pode de verdade prejudicar o aparelho auditivo. Cria-se em torno deste carro uma pequena ilha com poucos conhecidos e amigos, sem contato com o mundo exterior, ou até mesmo numa interação competitiva de agressividade com o carro ao lado, que também tem o seu grupinho e mil caixas de som. Sem contar a invasão desta cacofonia em tantos lares da vizinhança. Andando pela Avenida Nereu Ramos em Meia-Praia vemos estes grupinhos, seja em torno dos carros, seja nos barzinhos em torno das TVs. Não poderia ser tão duro na crítica e dizer que esta situação não seja válida ou que nela não exista nenhuma interação, porém a impressão que predomina ao andar tranquilo pela calçada é de hostilidade, individualismo e tribalismo num sentido ruim. As pessoas não estão se vendo, nem se ouvindo. O outro não interessa, o outro não importa.
E esta impressão se acentuou ontem à noite, abertura do Carnaval de Itapema na Avenida Beira Mar. Este mundo agressivo, individualista e surdo foi ofuscado pelos músicos, passistas, fantasias e sorrisos da Unidos do Tabuleiro. Música ao vivo, festa pública na rua, de graça, onde foi possível dançar e ainda conversar, interagir com outras pessoas. Como se fala no lindo carnaval pernambucano: foi possível brincar o carnaval! Ontem brinquei o carnaval de rua em Itapema! Fiquei muito emocionado e agradeço muito às pessoas que tiveram a iniciativa, sejam da administração pública, sejam da comunidade. Parabéns e obrigado aos músicos, passistas e a cada membro da escola de samba!
Obrigado por alguns instantes nos poupar do som ensurdecedor, das caixas mecânicas, das conversas aos gritos, da música descontextualizada da cultura. Obrigado por abrirem uma brecha ao Samba, ao Frevo, à Marchinha, à Bossa, ao Choro, ao Boi de Mamão, ao Maracatu, ao violão, ao cavaquinho, ao pandeiro, ao canto, às danças, à expressão e à criatividade. Obrigado Unidos do Tabuleiro por ajudarem a comunidade a se divertir. As pessoas estão com sérias dificuldades de diversão. A diversão está ligada ao consumo, a gastar sempre muita gasolina e dinheiro. Ontem vi que podemos nos divertir em comunidade, ouvindo “Itapema é uma só”, diversão aberta a todos, sem surdez, sem distância, interagindo.
Tenho certeza absoluta que se Itapema souber aproveitar as boas ideias deste carnaval e ouvir com atenção a voz que fala mais forte e mais longe que o modismo efêmero, em poucos anos terá uma grande e boa festa popular em suas mãos, ruas e areias.

Leandro Gaertner
(Doutorando em Música e Musicologia - Université Paris-Sorbonne)


Itapema, 5 de março de 2011.

Nenhum comentário: